sábado, 18 de abril de 2009

Matéria realizada para o Diarinho no Dia Internacional da Mulher de 2008

Triste realidade no Itajaí

Cresce o número de mulheres presas

As comemorações do Dia Internacional da Mulher passam longe do presídio Regional de Itajaí. As presas até lembram da data festiva, mas faltam motivos pra comemorar. A ala feminina tá superlotada, há pouco trabalho pra elas dentro do cadeião e, pra piorar, a administração da casa e a Polícia Civil registram um aumento no número de trancafiadas.

Atualmente 69 mulheres tão presas no cadeião de Itajaí, quando a capacidade são 22 vagas. A maioria delas caiu por tráfico de drogas. São mulheres de todas as idades distribuídas em cinco celas. A média é de 12 em cada cubículo, quando o ideal seria de apenas quatro. Há beliches e vários colchões espalhados pelo chão.

Apesar da superlotação e da pouca ventilação, as presas tentam manter tudo o mais organizado possível e pra isso dividem as tarefas diárias. Há três tanques pra lavar a roupa, um fogão e uma geladeira. Algumas preparam os alimentos, que são cedidos pelo Estado ou pelas famílias das detentas. Outras fazem crochê ou trabalham na produção de grampos de roupa.

O espaço limitado e o pouco volume de trabalho ainda são um empecilho para que as presas ocupem suas mãos e mentes. Esta é a principal reivindicação dessas mulheres. Elas querem mais trabalho, espaço pra produzir e gostariam que os empresários apostassem em seus talentos.

Por enquanto, além da produção de grampos, elas só têm atividades na terça e quinta-feira, quando fazem curso de massoterapia. Vinte muiés, as que tem melhor comportamento, tem direito ao curso. Uma delas já tem emprego garantido quando sair da jaula. Ela também auxilia o técnico de enfermagem no ambulatório de cadeião e faz planos de ter uma vida melhor quando voltar pra rua.

O ambulatório do presídio é outro problema. A assistência médica, psicológica e odontológica rola de segunda a sexta-feira, por ordem de solicitação. Após o pedido, as presas aguardam numa fila, igualzinho ao que rola no posto de saúde.

Desde o ano passado as mulheres não fazem exames exclusivamente femininos, como o preventivo. Tudo porque precisa ter uma enfermeira especializada, coisa que o cadeião não dispõe. Já as gestantes fazem o pré-natal na própria unidade. Atualmente o berçário tem três crianças, uma de um mês, outra menina de 20 dias e a mais velha com um aninho. Por lei, elas podem ficar com as mães até o final do período de amamentação, depois os pimpolhos são afastados.

"Foi terrível me separar deles. Eu fiquei três anos e quatro meses sem ver os meus filhos. Quando eu fui presa a mais nova tinha dois anos e quando ela me viu, três anos depois, nem eu, nem ela nos reconhecemos mais. Foi horrível", desabafa Maria Aparecida Muller, 42, a Cida, presa por tráfico de drogas.

A líder

Cida é uma das detentas mais antigas, caiu a primeira vez em 1994 e nesse meio tempo saiu e voltou mais duas vezes. Ela alega que, na última prisão, era inocente e que as drogas foram ‘plantadas’ em seu apartamento. Ela, dois filhos e duas noras foram presos por tráfico e formação de quadrilha. Eles aguardam julgamento. Cida é a grande líder das presas. É ela quem organiza e anota toda a produção de grampos, quem faz a intermediação entre os carcereiros e as detentas e também tenta administrar as brigas e tretas.

Cida conta que começou no tráfico assim que se separou do marido e como não sabia o que fazer da vida, um amigo lhe indicou que traficasse. "Se eu pudesse voltar atrás, com certeza minha vida teria seguido outro percurso", garante a mulher. Cida se arrependeu, especialmente porque levou as drogas pra dentro de casa e perto de seus filhos. Ela diz que o mundo do crime não compensa, porque há muita humilhação nas cadeias, pouca estrutura pra recuperação e o eterno peso de ser ex-presidiária.

Outra detenta que está no cadeião há 10 anos é Marlene de Souza Henriques, 60, carinhosamente chamada pelas colegas de cela de Mãezinha. Também presa por tráfico de drogas, a história de Mãezinha é um pouco diferente. Ela tinha uma situação financeira privilegiada, era mulher de um engenheiro da Marinha Mercante, mas teve uma grave depressão e começou a usar drogas pra se sentir melhor. O uso fez com que ela perdesse praticamente tudo. Marlene vendeu móveis e jóias pra consumir cocaína. O marido a abandonou e ela começou a traficar pra sustentar o vício. Foi presa em 96 pela primeira vez e desde então, como Cida, saiu algumas vezes e voltou pelo mesmo motivo. "A droga é um sofrimento", fala desconsolada. Marlene garante que hoje se livrou do vício e que mesmo com todas as dificuldades, os sete filhos nunca a abandonaram e continuam visitando-a.

Comemoração com faxina

Questionadas sobre o dia das Muiés, as presas falam que lembram da data, mas que não há comemoração ali dentro. Pra compensar a falta de festa, elas farão uma grande faxina pra esperar os filhos, companheiros ou amigos, que as visitam no domingo. Uma das detentas até brinca dizendo que hoje colocará uma roupa bem bonita. A brincadeira deixa transparecer que, por mais que haja grades no pequeno quintal da cadeia, ainda há esperança de dias melhores.

Mais mulheres presas

Segundo o administrador interino do cadeião, José Luiz Santos de Araújo, este é o maior número de mulheres presas já registrado no cadeião peixeiro. O ano de 2007 fechou com 62 presas e este ano já aumentou mais sete. "Varia muito. Hoje tem mais, amanhã já sai. Mas posso afirmar que é um número crescente. Nunca houve tantas mulheres presas", comenta. Ele informa que somente na quinta-feira quatro mulheres deram entrada no cadeião.

O administrador interino acredita que o motivo que leva as muiés pra cadeia seja o mesmo do homem: ganhar dinheiro fácil, sem trabalhar. "A maioria é presa por tráfico. Elas querem dinheiro, vida fácil e não querem trabalhar", aponta José Luiz.

O delegado Rui Garcia dos Santos, que trabalha há 37 anos na polícia, também percebe que as mulheres estão se envolvendo cada vez mais na criminalidade. Mas ele ainda acredita que as muiés são coniventes com os maridos ou namorados. Agem na parceria deles, e não saem por aí aprontando sozinhas.

Pro dotô o tráfico de drogas é o crime que leva mais mulheres pra jaula. Geralmente, elas assumem as bocas quando os maridos são presos ou mortos por gangues rivais. "Antigamente era muito difícil ver uma mulher presa", comenta Rui. A raridade era tão grande que o delegado lembra de um caso de 1974, quando uma senhora foi presa logo após matar o marido. No cadeião havia apenas ela de mulher. Atualmente a ala feminina abriga quatro vezes a a sua capacidade.

Um comentário:

Anônimo disse...

a rede de repressão a "comportamentos anti-sociais" é brutal. realmente, a pior parte é carregar o estigma de ex-presidiário. infelizmente, os cristãos de hoje já não sabem oq significa "perdoar".